Ao pé do muro - e do pré conceito

Estava arrumando minha biblioteca do escritório, organizando e limpando os livros quando achei esse livro que me acompanhou na graduação: Ao Pé do Muro. Creio que nem existe mais porque só encontrei em sebos na rápida pesquisa que fiz no Google. Quando abri uma página ao acaso vi um desenho de homem de terno saudando uma mulher NUA saindo de um poço. Postei a foto no Instagram como curiosidade. Mas...

arquitetando ideias

arquitetando ideias ...fui me dar conta que essa figura, em um livro didático e profissional era algo muito significativo. Me lembro que o Ao Pé do Muro era uma tradução de um livro técnico francês que era dirigido aos profissionais da construção civil naquele pais. Ele dava informações técnicas relevantes com uma linguagem clara e era cheio de figuras explicativas o que tornava a leitura mais amena. 
Mas confesso a vocês que eu não me dei conta, na época, de como a figura feminina aparece como coadjuvante ou mero enfeite. Folheando o livro hoje só vi uma figura onde mulheres aparecem trabalhando. É na parte de acústica e elas estão em um escritório. Em todas as outras figuras as mulheres aparecem fazendo trabalhos domésticos, sendo esposas ou estão em atitudes provocantes com pouca roupa ou nuas, seja como a moça que sai do poço, seja como estátuas ou sereias.
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Tudo bem, é um livro antigo, de repente reproduzia um mundo que não existe mais. Será? Esses tempos fiz uma postagem sobre mulheres na arquitetura e fala de uma realidade bem mais atual e ainda aponta essa cultura sexista e machista no ambiente da construção civil. Mesmo que o ambiente de obras tenha mudado bastante desde que me formei em 1982, ainda temos poucas mulheres recebendo prêmios expoentes como o Pritzker. Talvez isso mude com novas posturas das mulheres no ambiente da construção civil e em um futuro próximo tenhamos mais mulheres no comando e não apenas servindo de cenário.

A questão da caracterização do papel de alguém em livros, revistas, na sociedade marcando sutilmente papéis é super relevante. Vai marcando posições e comportamentos. Vai insinuando qual papel cada um deve ocupar. Se uma menina e/ou mulher se vê retratada em uma posição subalterna ou de ajudante pode ir internalizando que esse papel é justo e acaba por perpetuar os pré conceitos existentes. Vários artigos e estudos mostram que o caso desse livro não é exceção e e que essa realidade não mudou tanto assim. Vejam em Educação e a Imagem da mulher nos livros . Mais em A MULHER NA HISTÓRIA: REPRESEN TAÇÕES NOS LIVROS DIDÁTICOS de Maureen Javorski (PDF) e em
A MULHER E A HISTÓRIA: Um Papel Desigual de Sandra Alves Moura de Jesus (PDF)

Urge mudar essa história. Ajudar a resgatar o papel determinante que as mulheres sempre tiveram na história, seja a que é escrita em livros, seja a que é feita de lutas e conquistas diárias e que passa tão longe dos holofotes, mas que marca nossas vidas e garante conquistas tão importantes. Tantas mulheres tiveram papeis determinantes em conquistas que hoje desfrutamos. E a maioria ficou anônima. Lembro de um sonho de projeto da Sam Shiraishi de falar sobre as mulheres no século XX e mostrar, através de histórias de mulheres conhecidas, as lutas e avanços que resultaram em um poder maior de escolha para nós, suas descendentes. Escrevi sobre isso em Mulheres que me arquitetaram  

Que possamos ver mais representações femininas em papeis de comando, em meninas não apenas cuidando da beleza ou brincando de casinha, mas brincando também de ser pedreira, engenheira, arquiteta, piloto ou presidenta. (e sim a academia brasileira de letras reconhece que existe essa palavra -e a própria celeuma em torno dela já revela o quanto esse papel ainda não é natural em nossa sociedade). 

Autor: Elenara Leitão

PS: eu nem sabia que existia um livro moderno com esse nome e essa postagem nada tem a ver com ele.

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